quinta-feira, 30 de maio de 2013

Uma morte anunciada?????



No decurso dum processo de pesquisa noutra área, acabei por revisitar, recentemente, um editorial de primeira página do Semanário Expresso na sua edição de 30 de Dezembro de 2000.
Pelas razões que por certo compreenderão, não resisti à tentação da sua reprodução nesta sede, o que faço com a devida vénia.


O Fim da Aventura

O milénio que amanhã chega ao fim ficará registado na História de Portugal como o da aventura da independência. Independência iniciada no século XII com a revolta de um filho contra a mãe, confirmada em inúmeras batalhas contra inimigos estrangeiros, ampliada nos séculos XV e XVI com a fundação de um império colonial, defendida politicamente no início deste século.
E o que é possível constatar é que, enquanto as questões se resolveram pela força das armas, Portugal pôde manter a sua independência.
Pôde mantê-la, ainda, quando passaram a resolver-se pela via da política.
Mas, no momento em que a independência passou a jogar-se no plano económico, o país claudicou.
E, no dealbar do milénio, parece já não ter condições para resistir à «invasão europeia» e, em primeira linha, à «invasão espanhola».

Assim, o próximo milénio poderá ser, para Portugal, o da perda da independência.
A economia portuguesa definha e não revela qualquer capacidade para competir com as grandes - e mesmo com as pequenas - economias da Europa.
A balança comercial desequilibra-se a um ritmo assustador.
A agricultura está em declínio desde a década de setenta e 60% dos alimentos que comemos são já importados. Os subsídios da União Europeia têm servido em larga escala para alimentar a preguiça nacional, habituando-nos a viver à custa dos outros, fomentando hábitos de consumo que não têm qualquer correspondência com aquilo que produzimos.

Daqui a mil anos é provável que Portugal não seja já um Estado: seja pouco mais do que uma costa.
Uma costa extensa, com o atractivo de se situar no extremo ocidental da Europa, que alguns europeus escolherão para passar uns dias ao sol a comer marisco - se ainda for possível apanhar sol e se no mar ainda houver marisco.
O interior do território será, eventualmente, um deserto com meia dúzia de pontos de interesse, relíquias do passado, testemunhos de outros tempos (gravuras rupestres, megalitos, dois ou três castelos, uma ou duas catedrais), onde os turistas pararão para fazer umas compras e tirar fotografias - se ainda existir o hábito de fazer compras e houver máquinas fotográficas.

O milénio que agora acaba foi o da aventura de um pequeno povo situado nos confins da Europa - que conquistou a sua independência, teve uma expansão fulminante e entrou em declínio.
O milénio que agora começa muito dificilmente reservará a este povo em recessão numérica qualquer papel de relevo.
Será terrível pensar assim?
Às vezes é preciso ganharmos distância em relação ao que somos, olharmo-nos de fora, observarmos a realidade para lá da nossa própria circunstância.
A verdade é que a História não tem um fim.
Nenhuma conquista é definitiva.
Nenhuma etapa é a última.

Para memória futura !!...

segunda-feira, 27 de maio de 2013

PERFORMANCE E CONTROLO DE GESTÃO: OS DESAFIOS DO SÉC. XXI

O recrudescimento da competitividade que hoje caracteriza o ambiente em que as empresas e outras instituições operam, obriga os seus responsáveis a gerir com rigor para alcançar êxito.

Como assinalámos no nosso último texto, um dos principais, senão o principal, handicap que o tecido empresarial português evidencia no quadro da economia global, consiste nas inadequação, insuficiência e ineficácia dos seus modelos de Controlo de Gestão e Avaliação da Performance.

Muitas vezes, tal resulta duma deficiente contextualização dos problemas, nesta área, radicada em dois postulados absolutamente obsoletos:

  • O Controlo de Gestão é um domínio da Área Financeira da organização;

  •  Os problemas de Controlo nas organizações são ultrapassáveis mediante agilização de putativos sistemas de informação de gestão que são confundidos com as suas plataformas tecnológicas de suporte.

É por isso que nenhuma empresa ou qualquer outra instituição, hoje provavelmente, escapa à constatação de sete questões essenciais, que constituem outros tantos desafios que o séc. XXI coloca aos Executivos, aos quais urge dar resposta:

1.      Como intervir, de modo eficaz, sobre as causas e não sobre as consequências/sintomas dos problemas?

2.     Como analisar a performance panoramicamente, com os indicadores disponíveis? Como quantificar o quantificável conquanto não tradicionalmente quantificado?

3.     Como planear num contexto crescentemente imprevisível?

4.     Como prevenir, em organizações descentralizadas, a conflitualidade entre objectivos individuais/sectoriais e globais?

5.     Como compaginar as necessidades, cada vez mais específicas, de informação para gestão com as características, cada vez mais normalizadas, da informação financeira?

6.     Como extrair, num contexto aceleradamente marcado pela incerteza, conclusões úteis dum controlo orçamental eminentemente retrospectivo e financeiro?

7.     Como assegurar a ponderação adequada, no curto e no médio/longo prazos, das consequências do processo de tomada de decisão?


A constatação das evidentes limitações dos modelos tradicionais de Controlo de matriz financeira induz a indispensabilidade da mudança deste estado de coisas, mediante o reforço da sensibilidade dos Executivos para a dimensão estratégica do Controlo de Gestão no sucesso da organização moderna, num enquadramento caracterizado pela mudança acelerada.

A consecução do objectivo identificado pressupõe a abordagem prévia da dinâmica cíclica da gestão moderna, mormente a problemática do estabelecimento de objectivos individuais, sectoriais e globais, seu alinhamento, mobilização de recursos para o seu atingimento e a medição e avaliação da performance registada.

Para o efeito, encontram-se hoje disponíveis “ferramentas” competentes, das quais merece particular destaque o Balanced Scorecard, tema a que regressaremos em próxima oportunidade.


quarta-feira, 15 de maio de 2013

QUO VADIS ORÇAMENTO (II)

Como se começou a tentar demonstrar no primeiro desta série de textos, Planear, no contexto empresarial, não pode ser confundido com Prever.

Do exposto decorre, contudo, a questão com que culminamos o artigo anterior: se a produção orçamental é uma prática enraizada no tecido empresarial com um mínimo de dimensão, se na mesma se procede tradicionalmente ao by-pass das etapas constituintes do processo de Planeamento substituindo-as pela estipulação de Previsões mas, se se admite a incapacidade intrínseca do Executivo para o efeito, então... como é que se preparam os Orçamentos??...

Facilmente: Assumindo como previsões, meras extrapolações algébricas do passado, ponderando-o por factores mais ou menos standart, como taxa de inflação, crescimento do volume de negócios e, naturalmente, as famigeradas  “folgas” ou, mais brejeiramente, “coeficientes de cagaço”...

A metodologia do estabelecimento de previsões para suporte dum putativo processo de planeamento é, estruturante, anacrónico, mas, infelizmente, recorrente...
Experimente o leitor fazer o seguinte: peça a um seu colaborador uma previsão sobre a evolução futura de determinado item, legitimando-o a solicitar-lhe o que ele necessitar para o efeito; Nove em cada dez inquiridos solicitar-lhe-ão, imediata e espontaneamente, o valor desse item registado no período homólogo anterior...

Desta forma, o suporte do processo de planeamento em previsões inquina-o com o vírus da desresponsabilização.
Faça, mais uma vez, o leitor o teste: solicite a alguém uma previsão sobre algo fora do seu controlo; se obtiver resposta, provavelmente, ela resultará errada; Questione então a pessoa pelo falhanço; ainda, muito provavelmente, obterá como resposta, enquadrada num sorriso equívoco: “Bom... foi só uma previsão!!...”

Recorde-se, caro leitor, quantos astrólogos, na primeira quinzena de Dezembro de cada ano, enumeram as suas previsões para o ano seguinte; Consegue recordar-se de quantos dos mesmos, na primeira quinzena de Janeiro do ano seguinte justificam os seus erros?!...


Mas porque é assim? Porque, mais uma vez, como os indivíduos, honesta e responsavelmente não se arrogam de dotes premonitórios, defendem-se produzindo cifras não contextualizadas em termos de Planeamento, mas que são perfeitamente satisfatórias para o cumprimento do dever: o Orçamento!
Ora, para além do paradoxo em quem consiste tentar planear o futuro com base no passado num mundo em mudança constante e acelerada, a exclusividade do recurso a análises de tipo histórico para a produção de orçamentos, é um anacronismo grotesco que só conduz,

1º à não estimulação da criatividade,
2º à criação de constrangimentos endógenos à inovação,
3º ao recalque de comportamentos de resistência à mudança e, finalmente,
4º à institucionalização de vícios e ineficiências caracterizadores do passado.

Grave, ainda, é que é assim que o processo se torna endémico, na perspectiva organizacional, promovendo a substituição do ciclo virtuoso da gestão moderna – Planeamento → Realização → Controlo – por um ciclo vicioso de práticas – “Histórico” → Previsões → Orçamentos – que, ao esvaziar o conteúdo do processo de Planeamento, reduz o Orçamento a um mero exercício destituído de qualquer utilidade numa lógica de Controlo.

Duas novas questões se nos colocam então imperativamente: Para que servem então os Orçamentos? Alternativamente, o que fazer para lhes (re)conferir dignidade instrumental?

È na resposta a estas questões que consistirá o nosso terceiro e último texto nesta área.

sábado, 11 de maio de 2013

QUO VADIS ORÇAMENTO (I)


Há quase duas décadas atrás, dada a constatação sistemática do insucesso caracterizador da dinamização de sistemas integrados de Controlo de Gestão nas PME em Portugal, instituí uma hipótese: a existência duma relação causa-efeito sustentada entre a metodologia de planeamento prosseguida e a utilidade dos  processos de controlo.

A verificação convergente dum conjunto de circunstâncias favoráveis, permitiu o teste da mesma, mediante o recurso a um esquema muito simples: a solicitação a um conjunto de cerca de duas centenas de inquiridos, todos eles Empresários, Administradores ou Executivos de topo que, no prazo de cinco segundos, se pronunciassem sobre o que se lhes afigurava constituírem os sinónimos mais próprios de palavras que, então, lhes eram transmitidas.

As duas palavras em jogo foram “Planear” e “Planeamento”.

As respostas foram concludentes: quase 80% dos inquiridos a “Planear” responderam Prever... Quase 70% dos inquiridos a “Planeamento” responderam Orçamento...

A hipótese, ainda que em empiricamente, havia sido verificada: (sub) (in) conscientemente ou não, o travejamento do processo de planeamento em previsões reduz o seu conteúdo à mera produção orçamental o que torna inócua qualquer tentativa de controlo!!...

Como e porquê é o que tentaremos neste, e nos nossos próximos textos, evidenciar.

A actividade de Planeamento Empresarial é um processo complexo, em termos de conteúdos e protagonistas, que se desenvolve em torno de dois momentos essenciais: o Estratégico e o Operacional. O Planeamento Estratégico é um processo criativo, analítico, pouco estruturado muitas vezes fulanizado, onde, o que está em causa, a partir das Visão e Missão do negócio e da empresa é, sucessivamente, a estipulação apriorística de Objectivos, desde logo quantificados, calendarizados e realistas e que culmina, após a análise da situação de partida nas suas vertentes externa e interna, na formulação duma Estratégia coerente de abordagem do(s) mercado(s).

Aqui chegados importa agora, numa perspectiva sectorial, avaliar as necessárias contribuições para o êxito da Estratégia: definir Políticas de actuação; Quando uma dada Política é decomposta no conjunto de tarefas cuja execução compreende, dá origem a um Programa a cuja calendarização vulgarmente se designa por Plano; Quando um Plano é expresso, quantitativamente, em unidades monetárias, por forma a permitir uma comparação espontânea com as realizações financeiras sintetizadas na(s) Contabilidade(s), falamos, então, de Orçamento.

Do exposto espera-se que resulte, para além duma visão integrada do processo de Planeamento Empresarial, uma conclusão óbvia: o Planeamento não se esgota, nem se pode reduzir na/à preparação de Orçamentos!!...

A afirmação parece dever ser atribuída a William Thonson (Lord Kelvin):
“Só se pode controlar o que se puder medir”
Neste sentido, e, sem qualquer paradoxo, dir-se-ia que a preparação do Orçamento é, em simultâneo, a fase mais e menos importante do processo de Planeamento: Mais importante porque condição sine qua non do exercício do controlo dada a sua natureza quantitativa; Menos importante porque, enquanto corolário lógico de todo o percurso de planeamento anterior, é um mero exercício de álgebra!!...

A utilização abusiva do orçamento em substituição de todo o conjunto de tarefas precedentes, que constituem o processo de planeamento, é uma farsa que é perigosa, porque se “vende” bem, mas só serve para desacreditar o sistema e desmotivar os intervenientes.
Num artigo recente da FortuneWhy CEO’s Fail” concluiu-se, espantosamente, o seguinte:
g 60% das organizações não articulam os Orçamentos com a Estratégia;
g 70% das organizações não têm os incentivos dos gestores intermédios alinhados com a Estratégia;
g Finalmente, 95% dos colaboradores não conhecem ou não entendem a Estratégia.

Mas, questionar-se-á o leitor, como é isto possível? Como é possível o by-pass de todas as tarefas precedentes à sua elaboração, as quais, no fundo, estipulam os seus parâmetros, premissas e hipóteses? A resposta constitui a segunda parte da tese: Substituindo-os(as) por previsões na assumpção, mais ou menos explicita, que Planear consiste em Prever a evolução futura do curso dos acontecimentos!!...

Ora, Planear não é Prever!!...
Admitir que planear é prever produz imobilismo na organização. Experimente, o leitor o seguinte: Pergunte individualmente aos seus colaboradores o que irá vestir amanhã; mais de 80% das respostas, directas ou truncadas, consistirão em “Não faço ideia (...) não sei o estado do tempo (...) amanhã decidirei...”

Qual é o problema da resposta? Ser honesta e responsável: como o inquirido não se auto-reconhece capacidade para prever o estado do tempo, recusa planear a sua indumentária, adiando a decisão competente...

Ao condicionarem a  decisão de planear a vestuário à previsão impossível do tempo,  os seus colaboradores quedam-se imóveis, sem capacidade de resposta, adiando a decisão, num posicionamento declaradamente reactivo...

Independentemente da utilidade de que reveste a disponibilidade de estimativas suportadas em métodos e técnicas mais ou menos sofisticadas, o Planeamento não consiste no estabelecimento de Previsões; Antes, na identificação apriorística de acções a desenvolver para diversas alternativas possíveis de evolução dos factores não controláveis, isto é, no estabelecimento dum conjunto coerente de pares ordenados de relação causa-efeito do tipo “If... (Acontecimento)...”, “Then... (Acção)...”, que permitam antever as necessidades decorrentes do processo contínuo de adaptação à mudança; Planear não foi, não é e nunca será um exercício diletante de futurologia!!...

... Em contravenção nítida da máxima, hoje em dia recorrente aos mais diversos níveis das hierarquias social, política e empresarial que me deixa profundamente deprimido:
“Actualmente é impossível Planear já que o futuro é imprevisível!!...”

Com franqueza!!... Se o futuro fosse previsível não era necessário planear! Se o amanhã fosse igual ao ontem, como há décadas atrás, as empresas não precisavam de Executivos mas sim de “surfistas” que fossem na onda...

Mas, do exposto, decorre uma terceira questão: se a produção orçamental é uma prática enraizada no tecido empresarial com um mínimo de dimensão, se na mesma se procede tradicionalmente ao by-pass das etapas constituintes do processo de Planeamento substituindo-as pela estipulação de Previsões mas, se se admite a incapacidade intrínseca do Executivo para o efeito, então... como é que se preparam os Orçamentos??...

Esta questão como se reconhecerá é completamente diferente das duas anteriores: Travejar o Planeamento em Previsões e reduzi-lo à preparação de Orçamentos são realidades causais do estado de coisas a que se chegou no domínio da produção orçamental; Como se consegue produzir Orçamentos neste contexto, quais as suas limitações técnicas e implicações organizacionais e comportamentais, são as grandes questões-consequência objecto do nosso próximo texto.